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Da tradição à ciência

Pesquisa no IFCE estuda o uso de plantas medicinais na produção de alimentos

Estudos resultaram em bulas com indicações sobre plantas medicinais e na produção de alimentos como sorvetes, pães e biscoitos

Publicada por Andressa Costa em 23/04/2025 Atualizada há 1 dia, 5 horas

Em meio ao crescente interesse por alternativas naturais na saúde e na alimentação, um projeto desenvolvido no campus de Sobral do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) tem unido ciência, tradição e sabor. A iniciativa, que começou com a curiosidade sobre o uso popular de plantas medicinais, hoje já resultou em formulações de alimentos como sorvetes, dindins, pães e biscoitos, além de oficinas com a comunidade e elaboração de um e-book com bulas de plantas medicinais típicas do Ceará.

Tudo começou há mais de uma década, quando a professora de Química do IFCE Daniele Teixeira, do curso de Tecnologia em Alimentos, aceitou o convite de uma ex-colega da graduação para estudar plantas medicinais, a partir de uma parceria envolvendo projetos de pesquisa e extensão. “Nunca tinha estudado esse tema, mas vi ali uma oportunidade de unir a química orgânica com algo mais aplicado e próximo da realidade dos nossos alunos e da comunidade”, conta a professora.

Projeto com plantas medicinais

Bulas de plantas medicinais

O primeiro passo foi realizar um levantamento para mapear as espécies mais populares na medicina caseira local, a partir da aplicação de questionários em Sobral e em municípios vizinhos. Com base nos dados coletados, foi realizada uma revisão bibliográfica de estudos científicos sobre as 23 plantas mais citadas.

A proposta era elaborar fichas técnicas que funcionassem como bulas, conciliando a sabedoria popular com o respaldo da ciência. Afinal, quem nunca ouviu um parente indicar uma planta medicinal para tratar um mal-estar? Mas será que realmente funciona? Qual a maneira correta e segura de uso?

As bulas foram reunidas no e-book “Plantas Medicinais: sabedoria popular e conhecimento científico para o ensino das funções orgânicas”, publicado pelo IFCE. O material apresenta o nome popular e científico de cada planta, imagem para reconhecimento, propriedades, indicações, contraindicações, partes utilizadas e formas de uso. Entre as espécies abordadas estão alecrim-pimenta, alfavaca, aroeira, babosa, boldo, capim-santo, erva-cidreira, eucalipto e mastruz.

O e-book é resultado de uma parceria entre o IFCE e a Universidade Federal do Ceará (UFC), a partir da dissertação de mestrado da professora Zaide Cunha Maia, orientada pela docente Maria Goretti de Vasconcelos Silva, no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da UFC. Os estudantes do curso de Tecnologia em Alimentos do campus de Sobral do IFCE participaram ativamente do projeto, sob orientação da professora Daniele.

Além de orientar o uso correto e seguro das plantas medicinais, o e-book também contribui para o ensino de química orgânica de forma contextualizada, apresentando as funções orgânicas e as fórmulas dos princípios ativos de cada planta. Também foi criado um site para difundir o conhecimento sobre plantas medicinais relacionado ao ensino de química.

Uso de plantas medicinais na produção de alimentos

O projeto avançou e o segundo passo foi explorar o potencial das plantas medicinais além dos tradicionais chás, xaropes e condimentos. A partir dos estudos, identificou-se que elas podem ser empregadas na produção de novos alimentos funcionais, com propriedades que favorecem a saúde e o bem-estar.

Oficina pão de alecrim

Muitas dessas plantas contêm compostos químicos com atividades anti-inflamatória, diurética, antioxidante, antimicrobiana e expectorante, agregando não apenas aroma e sabor, mas também valor nutricional aos alimentos.

A primeira aposta foi nos sorvetes. “Escolhemos os sorvetes porque não exigem aquecimento, o que ajuda a preservar os princípios ativos das plantas”, explica Daniele. Antes, porém, foi necessário analisar a citotoxicidade das plantas, garantindo a viabilidade e a segurança alimentar.

No Laboratório de Laticínios do campus de Sobral do IFCE, alunos e professora realizaram testes utilizando extratos das plantas para saborizar a calda base dos sorvetes. Um dos destaques foi o de limão com capim-santo (acesse aqui a receita), além de sabores como hortelã-pimenta, malva-corama, gengibre e maracujá.

As formulações passaram por testes sensoriais, avaliando impressão geral, aroma, cor, sabor e textura. Os resultados mostraram boa aceitação, com participantes demonstrando interesse em consumir os produtos caso fossem comercializados. Segundo a avaliação, o sabor se assemelha ao do chá – porém mais agradável ao paladar.

Oficinas com mulheres

Nos últimos anos, o projeto ganhou uma nova vertente: oficinas voltadas para mulheres da comunidade. Os encontros começam com rodas de conversa sobre plantas medicinais e seguem com a preparação de receitas, como pães com alecrim, biscoitos de gengibre e dindins gourmet de capim-santo, além dos sorvetes. O objetivo é promover autonomia, geração de renda e valorização do saber popular (ver aqui receitas dos biscoitos e dos pães). As oficinas contam com o apoio da professora Joyce Timbó, responsável pelo Plano Piloto de Panificação do campus de Sobral.

O projeto virou um espaço de troca. A gente ensina, mas também aprende muito com o conhecimento que essas mulheres já têm sobre as plantas

professora Daniele Teixeira

A estudante de Gastronomia Bárbara Sousa participou da última oficina, em março de 2025. “Achei sensacional a ideia das plantas medicinais. Eles chamam a gente para fazer as receitas, explicam tudo direitinho. A que mais gostei foi a do dindim de capim-santo com limão. Uma explosão de sabor, nunca tinha provado. Me encantou muito. Também achei interessante que eles aproveitam tudo da planta”, conta.

Próximos passos

Com dezenas de resumos e artigos apresentados em eventos acadêmicos, trabalhos de conclusão de curso e até estudantes ingressando no mestrado com a temática, o projeto segue em expansão. Uma das egressas, Layana Mary Menezes, hoje mestre em Ciências dos Alimentos pela Universidade Federal de Lavras (UFLA), começou seu envolvimento com pesquisas ainda como estudante de Tecnologia em Alimentos no IFCE. “É um tema que mexe com a sociedade, impulsiona a gente a divulgar o que está pesquisando, a sair do laboratório. Isso move a gente, saber que a pesquisa está tendo retorno”, afirma Layana.

A próxima etapa, segundo Daniele, é organizar um segundo e-book, agora com as melhores formulações desenvolvidas ao longo dos anos. “Queremos que esse conhecimento chegue ainda mais longe”, conclui.

Receita em destaque: dindim gourmet de capim-santo

Ingredientes

Calda

  • 1 xícara de chá de açúcar (200 gramas)
  • 2 xícaras de chá de capim-santo (250 ml cada)

Creme

  • 1 pacotinho de gelatina sem sabor (5 g)
  • 5 colheres de sopa do chá de capim-santo gelado e forte (75 ml)
  • ½ xícara de chá de leite em pó (50 g)
  • 1 colher de sopa de folha seca de capim-santo triturada (2 g)
  • 2 caixas de leite condensado (790 g)
  • 2 caixas de creme de leite (400 g)

Modo de preparo

Calda

  1. Derreta completamente o açúcar em fogo baixo.
  2. Acrescente o chá de capim-santo fervente.
  3. Misture bem e deixe esfriar.

DICA: Use uma bisnaga tipo ketchup para facilitar na hora de colocar a calda nos saquinhos.

Creme

  1. Dissolva a gelatina no chá concentrado e gelado.
  2. Leve ao banho-maria apenas até a gelatina se dissolver e ficar com aspecto brilhoso — não deixe ferver.
  3. Separadamente, misture o leite em pó com o capim-santo triturado e peneire.
  4. No liquidificador, bata o leite condensado, o creme de leite e o pó peneirado (leite em pó + capim-santo) por 3 minutos.
  5. Acrescente a gelatina dissolvida e bata por mais 1 minuto.
  6. Preencha os saquinhos: primeiro coloque a calda no fundo, depois complete com o creme.

Reportagem: Tiago Braga - campus Sobral (agencia@ifce.edu.br)

Fotos: Jonas Araújo e Emmanuel Kant

Fonte: Daniele Teixeira, professora do IFCE (danielemaria@ifce.edu.br)

Palavras-chave:
Sobral Extensão Pesquisa Agência IFCE Alimentos Plantas medicinais

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